Em sessão na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) realizada na manhã desta terça-feira (21), o ministro Alexandre de Moraes, relator da Ação Penal (AP) 2694, votou pela condenação dos sete réus do Núcleo 4, ou “Núcleo da Desinformação”, da tentativa de golpe de Estado. Em relação ao réu Carlos Rocha, presidente do Instituto Voto Legal, o relator votou pela absolvição quanto a três crimes – golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado – e pela condenação quanto aos demais delitos.
Segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), os integrantes do Núcleo 4 seriam responsáveis por espalhar notícias falsas sobre as urnas eletrônicas e atacar instituições e autoridades. Todos respondem por tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Atos executórios
O ministro Alexandre de Moraes destacou que alguns dos réus estiveram envolvidos em cinco dos 13 atos executórios sequenciais reconhecidos pela maioria da Primeira Turma como evidência da materialidade dos crimes. Esses atos corresponderam a 13 episódios distintos, ocorridos entre meados de 2021 e 8 de janeiro de 2023, nos quais foram identificadas condutas que caracterizam a atuação de uma organização criminosa.
Milícias digitais
De acordo com o relator, o “Núcleo da Desinformação” atuou de forma estratégica, com a contribuição direta dos réus para a atuação das chamadas milícias digitais por meio de ataques coordenados e sistemáticos às urnas eletrônicas, a fim de desacreditar o processo eleitoral.
O ministro considerou que a ação do grupo seguia um padrão recorrente, com ataques direcionados não apenas a adversários políticos, mas familiares, independentemente da idade. Militares da reserva também foram ameaçados e constrangidos publicamente.
Confira, abaixo, os principais pontos apresentados pelo ministro Alexandre sobre cada réu.
Ailton Barros
Para o relator, está comprovado que o ex-major do Exército teve participação ativa no grupo e executou ataques virtuais direcionados ao alto escalão militar (comandantes do Exército e da Força Aérea), que resistia à ruptura institucional. Para o ministro, Ailton mantinha vínculos estreitos com o líder da organização criminosa, Jair Bolsonaro, e recebia ordens diretas do general Walter Braga Netto.
Ângelo Denicoli
De acordo com o ministro Alexandre, o major da reserva do Exército tinha vínculo permanente com os demais integrantes da organização criminosa. Segundo o relator, ficou comprovado que Denicoli participou da chamada “Abin Paralela” e serviu como elo entre os membros do grupo e o influenciador argentino Fernando Cerimedo, que, em novembro de 2022, fez uma transmissão ao vivo em que anunciou um dossiê com supostas fraudes nas urnas eletrônicas. Foi ele quem forneceu o material utilizado na disseminação dessa narratica falsa.
Giancarlo Rodrigues e Marcelo Bormevet
As condutas dos dois réus foram analisadas de forma conjunta porque, na avaliação do relator, ambos praticaram as mesmas ações, atuando diretamente na propagação de desinformação. Foi Alexandre Ramagem, na época diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), quem indicou Bormevet para a “Abin paralela”, onde atuou em conjunto com seu subordinado Giancarlo. Os dois coletavam informações sobre alvos do governo Bolsonaro mediante o uso ilícito de ferramentas e sistemas de pesquisa contratados pelo órgão, como o programa First Mile. Também ficou demonstrada, para o relator, a utilização de sistemas clandestinos, pagos em moedas estrangeiras, para obter informações de fatos e de autoridades, inclusive de ministros do STF.
Guilherme Almeida
Segundo o ministro, a adesão do tenente-coronel do Exército ao grupo criminoso está diretamente relacionada às suas atribuições no Comando de Operações Terrestres (Coter), onde exercia funções voltadas a influenciar grupos, afetar decisões de oponentes e neutralizar ações adversas. Os autos comprovam a ligação de Guilherme com Mauro Cid, a quem enviou o link de uma live de 4 de novembro de 2022 na qual foram veiculados conteúdos falsos sobre as urnas eletrônicas — fato confirmado pelo próprio réu em seu interrogatório. Dados extraídos de seu celular também confirmam o envio de mensagens em listas de transmissão e grupos de aplicativos insinuando manipulação eleitoral.
Reginaldo Abreu
Na avaliação do ministro, o coronel do Exército divulgou informações falsas para adiar a divulgação do relatório de fiscalização do sistema eletrônico de votação do Ministério da Defesa, que deveria ter sido concluído imediatamente após as eleições. As provas indicam que ele chegou a imprimir, no Palácio do Planalto, cópias de um arquivo contendo a minuta de criação do “gabinete de crise” que atuaria após o golpe de Estado, no qual teria posição de destaque na assessoria de inteligência.
Carlos Cesar Moretzsohn Rocha
Em relação ao presidente do Instituto Voto Legal, o ministro assinalou que Carlos Rocha falsificou documento que serviu de laudo para representação eleitoral em que o Partido Liberal (PL) pediu a anulação da metade das urnas eletrônicas utilizadas no segundo turno. Segundo o relator, as provas demonstram que, ao elaborar o documento, Rocha sabia que não havia nenhuma irregularidade no sistema de votação e, mesmo assim, aderiu à empreitada, para que a versão final do relatório continuasse a ser divulgada pelos meios de comunicação. O relator votou pela condenação de Carlos Rocha pelos crimes de organização criminosa armada e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Contudo, o ministro não verificou nos autos nenhuma menção a Rocha sobre troca de informações com os demais membros da organização criminosa. Por ausência de provas, votou para absolver o presidente do IVL dos crimes de golpe de Estado, dano qualificado por violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
Reabertura de investigação
O relator também considerou que, caso Carlos Rocha seja condenado, deve ser reaberta a investigação (Pet 12100) sobre crimes de organização criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito envolvendo o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto.
A sessão prossegue no período da tarde, com o voto dos demais integrantes da Turma. Acompanhe: